26 de abr. de 2011

LINA-JOÃO-DE-BARRO (OU: CASA SE CONTROLA?)

O texto “Na Europa a casa do homem ruiu” serve como prelúdio a este. Não sei se a Lina Bo Bardi imaginava que uma casa projetada por ela seria tão frágil e humana também.












Algumas semanas atrás fui visitar uma ruína. Era a casa Valéria P. Cirrell, construída em 1958 por Lina-joão-de-barro para uma amiga. Dava pena o estado em que a encontrei, mas pudera: está desabitada desde o ano passado, quando foi a leilão (lance mínimo: R$ 2,7 milhões). Até agora não apareceu um comprador.

A casa era uma ruína não só pelo aspecto derelito mas pelas inúmeras modificações, acréscimos etc. à planta original. Mas casa se controla? Os sucessivos moradores deveriam preservá-la só porque era de autoria de uma grande arquiteta, ou poderiam mesmo reformar o telhado da edícula que era de zinco e pingava, construir mais um quarto e ampliar a parte de serviços para atender às suas necessidades? A moradora não poderia colocar os cristais que bem entendesse na cobertura, e mesmo fazer um jardim com eles?

Não encontro resposta. Sinto pela originalidade perdida, pela falta de cuidado. Tenho saudades dessa casa em um estado que nunca vi. Gostaria de vê-la habitada, sendo casa. Com pessoas saindo do quarto (terra), pisando na varanda (grama) e depois no deck de madeira (pedras), para então mergulharem na piscina (lago). Subindo e descendo a escada em espiral, acendendo a lareira, olhando lá do mezanino os que ficaram embaixo.

















Como toda ruína, a casa conserva alguns pontos de seu estado original. “Aqui essa parede está do jeito que a Lina fez, colou com as próprias mãos esse azulejo quebrado”, me disse a atual dona.

Fixo minha atenção no azulejo quebrado e, por um instante, esqueço de todo o resto.

















(Ao sair, não por acaso lembro do Leminski: "qualquer caverna habitável tem tido mais atenção do que as ruínas. E, no entanto, a ruína é o sentido de final de tudo, o significado dos quartos de empregada, das privadas de quintal, kitchenettes, apartamentos, palacetes, palácios, castelos, mansões, vilas, palafitas e cabanas" [1].)

__________

[1] Paulo Leminski, "A nova ruína". Revista Noz, n. 3, 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário